quinta-feira, 20 de setembro de 2012

(Conto) Meu sacrifício



Vislumbrou um último sorriso de lado, aquele rosto moreno, simpático e redondo lhe dizendo o adeus de sempre. Todos os dias havia o adeus, porque aquela não era a sua casa. Ela não era sua mulher.

Ele ficava constrangido em sair, assim, sem outro motivo senão voltar para a esposa e o filho. Era sua obrigação como marido e pai. Mas e quanto à amante? A namorada, como ele gostava de chamá-la. Como ela deveria ficar?

Resignada, ela lhe lançou um beijo preguiçoso. Sentia o peito arder por dentro, fazendo a garganta coçar de tanta dor. Isso até tornava a despedida mais agradável porque, assim que ele finalmente fosse embora, ela poderia chorar dois baldes cheios de lágrimas, se assim quisesse.


Mas ela nunca queria, realmente. Só ficava com aquela angústia, aquela vontade de tê-lo por muito mais tempo. Não todo o tempo. Só que pelo menos o dobro do que tinha atualmente.

Quando ele fechou a porta, ela enfiou a cabeça no travesseiro e deu um grito, abafado pelas plumas. Socou a cama, bateu com os pés e agiu como uma criancinha enfezada. Quando levantou a cabeça, o rosto vermelho, os olhos brilhantes, arfando, lívida, percebeu que ele voltara, para pegar alguma coisa sobre a mesinha ao lado da porta. As chaves da moto.

Droga.

Ele ficou um bom tempo apenas parado, observando, como que decidindo se ia embora fingindo que não viu nada, ou se fazia qualquer outra coisa. Desde abraçá-la e cobrí-la de beijos a gritar junto.

Ele ficou sério, soltou um suspiro e voltou devagar até a cama, sempre olhando para baixo. Ela sentou-se com as pernas cruzadas, puxando o lençol pelas costas. Pensou que ele diria qualquer coisa, menos "Você sabia que eu era casado."

Não, não podia lidar com esse tipo de conversa agora.

"Olha, me desculpa por você ter visto essa ceninha, mas é normal, mulher é assim mesmo, gosta de encenar pra sí mesma depois que o homem se vai..."

"Tá. Então, eu vou embora."

Era como se pedisse permissão. Isso sim a irritava. O relacionamento deles deveria ser livre, porque tinha que ser o oposto de um casamento.

"Eu nunca disse que você não poderia ir. A porta, inclusive, ainda está aberta."

O tom rude dela o irritava muito. Ele não gostava de ter situações sérias com ela. Com ela, deveria ser diversão. Só alegria, risos e prazer. Mais nada.
Mas ela era mulher, pelo amor de Deus. Com certeza sonhava com as grinaldas, o buquê, os convidados, as fotos. Mas ele não deixou claro que era casado? Onde foi que ela perdeu esse detalhe? Precisava ensinar a ela para quê servia a maldita aliança de ouro 18 quilates na mão esquerda?

"Então, eu vou nessa."

"Até a próxima."

Deixou pra encenar a birra só depois de ouvir a moto se afastando.

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